Por onde anda o nosso futebol?
Flávio Mobaroli
Lembro quando o futebol emocionava. E era tanto, que me rendeu inúmeras brigas em casa, fosse pelas frequentes idas aos estádios ou pelas longas horas diante da televisão.
Quem viu Zico, Júnior, Sócrates e Falcão jogarem (eu era criança, mas me lembro bem) sabe do que estou falando. Ou mais tarde, aqueles que se encantaram com a graça e o charme do Campeonato Carioca de Romário, Edmundo, Túlio Maravilha, esses também podem me entender.
Enfim, aos que já carregam algumas boas primaveras, o futebol era a cereja do bolo nos finais de semana e a munição para a boa sacanagem da segunda-feira com os amigos de outras bandeiras. Gostoso e simples assim. Sem outras consequências. Sem sequelas.
Hoje, exceção feita vez por outra ao time de coração, ou quando háum Barcelona ou Bayern de Munique como protagonistas, já nem paro de frente à TV. Aquela resenha, tão aguardada às vésperas de um clássico, ou ao final dele, também não me pega mais. Perde-se tempo em demasiafalando sobre tudo aquilo que faz o futebol menor.
A arte e o entretenimento já não são mais o foco. Violência, erros de arbitragem, ausência de torcedores, diretorias incompetentes, fórmulas patéticas e federações mal intencionadas – para citar alguns assuntos– estão na linha de frente dos comentários, como se esses não fossem apenas a consequência dapobreza daquele.
Quando falta qualidade em campo, sobra tempo e razão para tantas irrelevâncias.
Poucos falam, e falam pouco, sobre o que realmente importa no futebol. Após a derrota acachapante frente à Alemanha na ‘Copa do Mundodo Brasil?’, ensaiou-se alguma mudança e a palavra reestruturação virou a bola da vez. Mas, como toda modinha, passa com o primeiro vento mais forte.
Aí a gente se toca que o Marin continua presidente da CBF, que o Dunga voltou ao comando da seleção, que metade das arenas de milhões de reais está subutilizada (e a outra metade é quase sempre deficitária), que as nossas categorias de base, com raras exceções, continuam desestruturadas e que o nosso futebol não inspira confiança. Administrativa, moral e técnica.
Ou os gestores do esporte colocam as coisas no lugar, ou o nosso lugar vai ser este mesmo, de figurantes no cenário internacional. Hoje, todo mundo nos assusta. Para não ir muito longe, aqui na América do Sul não estamos à frente de Colômbia, Chile e Uruguai, sem contar da vice-campeã Argentina.
A arrumação deve começar pelo canto mais sujo da casa. É preciso [re]ensinar o brasileiro a jogar bola. Não estou falando de futebol ainda, é bola. Respeito as escolinhas, mas sinto saudade dos campinhos de rua, que aos poucos foram sumindo, em um processo que paralela e simultaneamente fez praticamente desaparecer os nossos craques.
Talvez seja hora de deixar a criança ser criança e só depois disso incluir os conceitos de responsabilidade e competitividade. A diversão vem primeiro na escalada da vida, não é por acaso que começamos a estudar aos quatro, cinco anos e a trabalhar bem mais tarde. Deve ser assim também no futebol.
Isto feito, é fundamental dotar as categorias de base de uma estrutura compatível com a cobrança que recai sobre os meninos que lá estão em busca de um sonho, de uma vida melhor. E isso inclui colaborar na educação. É clichê, mas mesmo aqueles para os quais a sorte sorri, ter uma formação é importante para depois da aposentadoria.
Fora de campo bastam honestidade e qualificação profissional dos dirigentes. Com essa premissa, mais o compromisso com o clube, que deve levar o presidente a ler e só concordar com os termos de uma competição se ela for realmente saudável e decente – o que já evitaria muitas críticas e chororos – a coisa vai bem. E indo bem, a gente sabe que a mesma torcida que tem se ausentado dos estádios, responde com presença e apoio.
É bem verdade que esse texto se perdeu do autor e caminhou na direção das reclamações que tiram do foco o futebol, a bola rolando. Mas se trata de um desabafo contra o produto sem encanto entregue toda semana nos estádios e na TV.
Flávio Mobaroli é jornalista e ex-fã do futebol brasileiro