“Boatos sobre mosquito e zika atrapalham a ciência”

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 Marcelo Daher 07,11,14 (15)

Infectologista diz que o que está acontecendo em relação à saúde é tão novo para a população leiga como para a ciência, por isso algumas novidades se tornam dúvidas

 

LUIZ EDUARDO ROSA

 

Vários boatos sobre o mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, chicungunya e zika, circulam na internet, o que implica em muita desinformação na conversa cotidiana das pessoas. A falta de certezas dos médicos em relação à ligação da zika com a microcefalia ajuda a piorar esse quadro. O assessor técnico da Secretaria Municipal de Saúde (Semusa), médico infectologista Marcelo Daher, esclarece nesta entrevista o que é verdade e o que não passa de boato quando se fala em Aedes aegypti. Leia a seguir.

 

Muita gente tem acreditado que o mosquito Aedes aegypti também pode transmitir o vírus HIV?

Isso não tem o menor fundamento, porque o vírus HIV necessita de determinadas células para que ele se replique dentro do mosquito e, também, para que a fêmea do Aedes possa passá-lo para suas crias. Os vírus que se utilizam dos mosquitos como vetores são chamados de arbovírus. Outros tipos de vírus fora dessa característica não conseguem se replicar nos insetos – entre eles, o vírus HIV, causador da Aids.

 

O vírus da zika pode ser transmitido por um beijo ou relação sexual?

Em relação ao zika, não está descartada essa possibilidade, porém até o momento não sabemos com que grau este contato consegue realizar a transmissão do vírus de uma pessoa à outra. Entendemos até o momento que o contato de mucosas não é a maneira mais eficaz de transmissão de vírus. A probabilidade de contágio segue sendo relativa e com poucas comprovações. Temos que esperar um tempo para um detalhamento científico melhor, para que possamos emitir informações oficiais. A epidemia se dá principalmente pelo mosquito vetor sendo a forma de contágio mais eficaz. As outras são com uma eficácia menor.

 

O suor do corpo consegue atrair ainda mais o mosquito Aedes aegypti?

O que atrai mais o mosquito é a temperatura elevada do corpo. Independente de ser um calor em maior intensidade, gerando suor, ou menor havendo somente uma elevação da temperatura. Tanto para o Aedes, quanto para outras espécies, é o calor corporal que aguça a identificação de um animal com sangue. O suor não é o principal fator de atração e sim a temperatura corporal.

 

Em redes sociais houve a divulgação de uma hipótese da vacina contra a rubéola com lotes vencidos, que ministrada à população teria contribuído para os casos de microcefalia e que a atribuição ao zika foi uma forma de mascarar essa responsabilidade. Que considerações podem ser feitas desta afirmação?

Primeiramente a vacina contra a rubéola vencida, ela não funciona, não há efeito seja qual for. As campanhas de vacinação contra a rubéola em populações de risco aconteceram no mundo todo. Então porque isso só aconteceria no Brasil? Na última campanha realizada em 2006 não surtiria um efeito nos casos de microcefalia que aconteceram agora em 2016. Muitas dessas informações são teorias da conspiração.

 

Essas teorias que são elaboradas geram algum impacto na saúde pública?

O que é importante destacar é que tudo o que está acontecendo neste momento em relação à saúde é tão novo para a população leiga como para a ciência. Então alguns fatos são novidades e acabam se tornando dúvidas. Certas situações vão aparecendo de maneira imprevisível e ao longo do tempo vamos conseguindo as respostas. O que acho que a população não deve fazer é pensar que está se escondendo algo dela, como uma arma biológica. O boato repassado por uma pessoa, que passa adiante mesmo sem acreditar nele, contribui para a desinformação, atrasando pesquisas e outras atividades científicas para dar mais certezas em relação à saúde. A população deve entender isso, não dando crédito às teorias da conspiração, achando que um grupo ou país está atacando silenciosamente o Brasil através de epidemias. Não há nada disso.

 

O que está comprovado e é seguro a respeito da ligação do zika com a microcefalia?

A comprovação de que o zika tem a ver com os casos de microcefalia está constatada, foi provada a destruição realizada nas células que formam o sistema nervoso do embrião. A microcefalia não é uma exclusividade do zika, ela é um achado clínico já reconhecido pela medicina. Outra lenda que foi associada à microcefalia foi o contato das mulheres com o próprio veneno que os agentes despejam nos focos do mosquito ou com o fumacê, o que atualmente está provado que não procede.

 

A romã espetada por cravos, a plantação de citronela em casa e o uso de borra de café nos xaxins de plantas são alguns exemplos de repelentes que a população entende como forma de afastar o mosquito da dengue. São medidas eficazes?

Essas medidas são transitórias para afastar o mosquito vetor das residências. De fato, algumas dessas medidas que exalam cheiro conseguem afastar o mosquito. Porém isso não é suficiente, o que é de fato eficiente é o combate ao criatório do mosquito. A citronela, por exemplo: até mesmo para que ela libere o odor necessário para repelir, vai muito além de simplesmente plantar este vegetal. Para que o cheiro seja expelido depende de ser feito constantemente manejos específicos e repetitivos no canteiro. Essas medidas podem ser feitas, o que não pode acontecer é achar essas ações substituem a forma mais eficaz que é o combate aos criatórios do mosquito. Essas medidas mais populares são perfumarias. A medida da borra de café é interessante quando funciona como a areia reduzindo o reservatório, este pensamento está no caminho certo em reduzir os lugares de água parada, agora nada substitui o combate aos reservatórios do mosquito o máximo possível.

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