A história que nasce nos bairros
LUIZ EDUARDO ROSA
O processo de urbanização, organização das cidades, sempre foi relegado a governos e figuras políticas no senso comum e no discurso oficial. Na migração massiva do campo para a cidade nas décadas de 1970 e 1980, as associações tiveram um papel importante, ao não deixar que setores afastados do centro ficassem à margem das políticas públicas. Três associações de bairros em Anápolis apresentam suas memórias, em fatos em comum e outros que singularizam o protagonismo de cada uma delas.
As associações de moradores em Anápolis tiveram suas histórias de protagonismo nos rumos da urbanização e construção social da cidade. Apesar de Anápolis carregar em seus 109 anos uma história em particular, é recheada de histórias dos bairros que formam a cidade. Estas histórias se somam na construção da identidade da cidade, nas quais se criou um sentimento de pertencimento com o seu setor por parte dos moradores. Uma série de lideranças populares se destacou em seus bairros e entre estes são colocados três exemplos entre tantos outros, com até mais anos de atuação.
A Associação de Moradores do Bairro de Lourdes e Chácaras Americanas, inaugurada em 1978, levou um loteamento da década de 1950 sem asfalto e energia, para um acesso cada vez maior aos equipamentos públicos. Asfalto, cobertura de energia elétrica, água e esgoto, inclusive orelhão telefônico eram bens públicos que além de trazer transtornos. A falta destes bens distanciava socialmente as comunidades, marginalizando os moradores de bairros como o de Lourdes, nas condições de desenvolvimento e inclusive estigmatizando quem lá morava. A organização da Comunidade Eclesial de Base (CEBs) foi um dos meios pelos quais foi possível uma maior mobilização e conscientização dos moradores para se unirem pelo bairro.
Dessa forma também em 1982, a Associação Pró-Melhoramento da Vila Formosa (Aspromevi) reivindicou as melhorias para o setor e por vezes até “metendo a mão na massa” literalmente. Sem calçadas em um dos grupos escolares, mutirões foram realizados para implantar aquele bem de maneira a diminuir os perigos para as crianças que frequentavam a unidade. Ações de alguns líderes propiciaram a promoção da assistência social em seus setores, sem estarem no Legislativo ou Executivo municipais. Bailes e promoções de práticas esportivas eram uma das formas de aproximar os moradores das Associações, criando uma maior sociabilidade no setor, e assim gerando um maior sentimento de pertencimento, fortalecendo nas reinvindicações pelas melhorias nos bairros.
Os eventos sociais foram estratégias também utilizadas pela Associação dos Moradores do Jardim Goiano, no setor IAPC, que organizou torneios de futebol, carnavais e atividades esportivas de diferentes modalidades. A proximidade dos moradores apresentou força representativa para defender a construção do Feirão Coberto do IAPC, que se concretizou em 1988. As Associações, tanto do IAPC quanto de Lourdes, participaram diretamente de um dos programas de nutrição infantil do país, na distribuição do ticket ligado ao chamado Programa Nacional do Leite (PNL), criado em 1987, na gestão federal do presidente José Sarney. O PNL distribuiu 8 milhões e litros de leite por dia atendendo três milhões de crianças de 0 a 6 anos, em situação de vulnerabilidade social. Algumas lideranças se valeram por não respeitar as regras de distribuição, porém alguns exemplos de dirigentes em Anápolis que tiveram grandes inimizades pessoais, por cumprir com seriedade os critérios do programa.
Estas são algumas das histórias de protagonismo destas entidades, que estão no meio de muitas outras na cidade. A atuação destes líderes causou, segundo alguns relatos deles, até “ciúmes” dos legisladores municipais, sendo tachados de “vereadores sem mandato”, por sua insistência nas reinvindicações e representatividade. Alguns destes personagens, “com e sem mandato”, estiveram nas páginas do JE Bairros; como Bernardo Araújo, Manoel Pereira, Maria Zenita, Agmar do Monte Alencar, Edvaldo Mariano, Jackson Charles, Vilma Guimarães Tostes, Romeu Felício, Alberto Luiz Rodrigues, Valdemar Alves dos Reis e Gracinda Maria da Silva.