Advogados podem conduzir investigações
Publicado: 01.06.2021
O universo jurídico nacional tem passado por importantes mudanças nos últimos anos, e, devido à pandemia do Novo Corona Vírus, se intensificaram essas mudanças, com ajuda da tecnologia. Os tribunais ao redor do Brasil, liderados pelo CNJ, aderiram a diversas formas de melhoramento dos serviços do judiciário, tendo, inclusive, criado plataforma de atendimento online, onde o advogado pode despachar com os magistrados de maneira remota e as partes serem intimadas por aplicativo como WhatsApp.
A advocacia também tem se reinventado, inclusive sob a orientação do Conselho Federal da OAB, que vem trazendo novas prerrogativas aos advogados. Um exemplo são as discussões para as modificações de publicidade dos advogados, que utilizam de ferramentas para divulgar a imagem de seu escritório nas redes sociais e demais sites.
Merece maior destaque o provimento 188/2019, que trouxe aos advogados uma importante funcionalidade, a “Advocacia Investigativa”.
O common law é um sistema jurídico utilizado em países de língua inglesa e é comum assistirmos seriados jurídicos e filmes, como por exemplo, Law & Order, Suits, How to get away with murder e Better call Saul e “O poder e a lei”, onde advogados de defesa conduzem investigações próprias em busca de provas que visem inocentar a seu cliente.
Essa nova atribuição aos advogados é denominada de “advocacia investigativa”, bastante comum nos Estados Unidos, onde os patronos de defesa ou escritórios de advocacia têm seus próprios detetives particulares a fim de coletar provas inocentadoras dos clientes, ou que pelo menos cause dúvida razoável ao Júri.
No Brasil, tal prática tem começado a engatinhar, em 2018, o Conselho Federal da OAB assinou o provimento 188/2019 que regulamentou de forma administrativa, as práticas relacionadas à Advocacia Investigativa. Nos termos do referido provimento, entende-se por investigação defensiva (ou advocacia investigativa) o complexo de atividades investigatórias com ou sem assistência de consultores técnicos ou profissionais legais (detetives particulares) que visem à obtenção de provas lícitas. A prática é destinada unicamente para produção de acervo probatório.
O Conselho Federal da OAB também caracterizou a prática como atividade privativa da advocacia, classificando-a como prerrogativa. Desta forma, o advogado terá a segurança de não precisar comunicar às autoridades competentes as suas buscas, e receber tipos de censura ou impedimento por parte das autoridades públicas.
Claro que, atualmente, são raros os advogados com conhecimento amplo em técnicas de investigação, não à toa, o provimento previu a permissão de assistentes técnicos, peritos e investigadores particulares que podem se associar ao advogado/escritório, a fim de auxiliar na incessante busca de provas defensivas.
As regras ainda são “recentes” e devem ser levadas ainda ao conhecimento tanto da maior parte da população, quanto da comunidade jurídica. Essa nova prerrogativa advocatícia busca também reforçar o princípio da paridade de armas junto aos órgãos do judiciário, vez que, até então, somente o Ministério Público e a Polícia Judiciária tinham autonomia para investigar, e junto a isso, pouco se falava investigar sob o ponto de vista do investigado, sendo o nosso sistema processual voltado ao Inquisitorial/Acusatório, as investigações sempre serão voltadas para demonstrar culpabilidade. Dessarte, com os advogados tendo autonomia de investigação, e nesta, tendo um cunho mais defensivo na confecção do acervo probatório, a defesa poderá levar a juízo suas próprias provas, não mais necessitando esperar o decorrer do processo para tal.
Uma das complicações que os advogados poderão enfrentar ante as atividades de investigação, são as diligências em buscas por documentos ou informações junto a instituições privadas. Conforme o provimento citado alhures, o artigo 4º garante “poderá o advogado (…) promover (…) obtenção de dados e informações disponíveis em órgãos públicos ou privados (…) ressalvadas as hipóteses de reserva de jurisdição”, pode ser que representantes de órgãos privados recusem entregar gravações de seus circuitos de segurança por não se tratar de uma lei federal especificamente.
Portanto, em um momento mais embrionário que a advocacia investigativa se encontra no Brasil atualmente, far-se-á necessário o diálogo, não só para obtenção de dados e documentos, mas também de testemunhas e depoimentos de pessoas que poderão estar envolvidas no delito que o advogado ou escritório será constituído a defender. E em um futuro (que espero próximo) o Congresso Nacional aprovar uma lei regulamentando as atividades da investigação defensiva por advogados, para resguardar a segurança jurídica desses nobres profissionais indispensáveis à administração da justiça, como forma de reforçar o princípio da paridade de armas junto aos órgãos do judiciário:
“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.” – Súmula Vinculante 14 STF.
Dr. Márcio Cunha