Executores monitoravam Marielle Franco antes do crime
Informação está na delação do ex-policial Élcio Queiroz
Publicado em 25/07/2023 – Por Cristina Indio do Brasil – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro
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A vereadora Marielle Franco, assassinada no dia 14 de março de 2018, no bairro do Estácio, região central do Rio de Janeiro, vinha sendo monitorada desde agosto de 2017, ou seja, sete meses antes do crime. A informação é do ex-policial militar Élcio Queiroz em delação à Polícia Federal e ao Ministério Público do Rio de Janeiro.
De acordo com o delegado da PF Guilhermo Catranby, um dos integrantes do grupo de investigação do crime, o colaborador revelou que o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, conhecido como Suel, preso nesta segunda-feira (24), começou a participar da elaboração do crime nos meses de agosto e setembro de 2017 até “o exaurimento do crime, leia-se, ocultação dos instrumentos utilizados na ocasião do crime como por exemplo o veículo Cobalt prata usado pelos executores naquela fatídica noite”.
“Em relação a execução em si, o Élcio dá os pormenores do que aconteceu desde a chamada do Ronnie [Lessa, ex-policial] ao meio dia pelo aplicativo de mensagens instantâneas, que se auto deletam após efetivamente lidas. Ronnie chamou o Élcio para a sua residência, chegando lá o Élcio já avistou Ronnie com uma bolsa, ambos se dirigiram ao Cobalt prata na saída do condomínio”, informou.
Delegado da Polícia Federal Guilhermo Catramby, fala à imprensa sobre a Operação Élpis – Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
O carro foi visto próximo à Casa das Pretas, na Rua dos Inválidos, na Lapa, centro do Rio de Janeiro, onde a vereadora estava participando de um encontro. O delegado disse que foi comprovada a versão sobre a vigilância do local apresentada por Élcio, ao informar que durante todo o trajeto desde a saída de casa até o centro do Rio, Ronnie estava no banco da frente do veículo, mas chegando ao local, com auxílio do Élcio, foi para o banco de trás, se equipou e permaneceu ali “fazendo a vigilância da vítima”.
Além de confessar a sua participação no crime, Élcio apontou o também o ex-policial militar Ronnie Lessa como autor dos assassinatos. “A partir da saída de Marielle, de Anderson e da Fernanda, ambos seguiram no Cobalt, emparelharam, e todos sabemos o que aconteceu. A rota de fuga ele detalha com minúcias: seguiram pela Leopoldina, pegaram o acesso à Avenida Brasil, dali foram para a Linha Amarela, desceram na última saída da Linha Amarela em direção ao Méier”, revelou.
Já no bairro da zona norte, Ronnie Lessa interfonou para o seu irmão Dênis Lessa, na casa dele. Os dois entregaram os equipamentos utilizados no crime e Ronnie pediu ao seu irmão que chamasse um táxi. “É aí o nosso elemento de corroboração mais efetivo, mais contundente. Conseguimos junto à cooperativa de táxi o rastreamento dessa corrida de ambos do Méier até a Barra da Tijuca, local o qual embarcaram novamente”, disse, acrescentando que ali os dois ativam os seus celulares. “Basicamente esta foi a dinâmica do crime no dia 14 de março de 2018”.
Pesquisas
Dois dias antes do crime, Ronnie Lessa fez pesquisas em uma empresa privada de dados do CPF da Marielle e de sua filha Luyara. O delegado Catranby disse que esse fato ainda não tinha aparecido nas investigações, até agora, e quando apresentado a Élcio Queiroz contribuiu para ele fazer a delação. Outro fato, conforme o delegado, que incentivou a colaboração, foi o depoimento da mulher de Ronnie Lessa, que indicou que nem o marido e nem Élcio estavam na residência do casal, o que contrasta com as versões dos dois à Justiça.
O delegado da PF acrescentou que apesar de ter conhecimento sobre o planejamento do crime, Élcio contou que não participou das execuções, porque começou a integrar as ações do grupo no dia 14 de março de 2018.
“Ninguém colabora se achar que tem alguma chance de ser absolvido, portanto, as provas hoje são muito contundentes contra o Élcio, por isso ele entendeu por bem colaborar”, explicou o promotor de Justiça Eduardo Morais Martins.
Prisão
A delação levou à prisão nesta segunda-feira do ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, conhecido como Suel, no âmbito da Operação Élpis, deflagrada pela Polícia Federal e pela Força Tarefa Marielle e Anderson (FT-MA) junto com o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Rio de Janeiro (Gaeco/MPRJ).
“O Maxwell, antes do crime, participa da manutenção e da guarda do carro, participa da vigilância da vereadora e imediatamente no dia seguinte ao crime auxilia os executores a trocar as placas do veículo e auxilia também ao contatar a pessoa que foi responsável em se desfazer do carro. Posterior ao crime, segundo o colaborador, era ele quem auxiliava junto com Ronnie na manutenção da família do Élcio e de sua própria defesa. Ele vinha, até recentemente, auxiliando os executores a se eximir da sua participação”, detalhou Martins, lembrando que Maxwell já tinha sido preso por auxiliar Ronnie Lessa a se desfazer das armas, conforme foi apontado na Operação Submerso, ao jogá-las no mar.
Ainda segundo o promotor, a decisão de pedir a prisão de Suel foi com base em informações de que ele continuava se desfazendo de provas, e também por indícios de participação em atividade de organização criminosa. “Tudo isso foi levado em consideração no nosso pedido, que foi atendido pelo Judiciário”, informou.
Milícia
Superintendente da Polícia Federal no Rio, Leandro Almada, fala à imprensa sobre a Operação Élpis – Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
O superintendente da PF no Rio de Janeiro, Leandro Almada, informou que foi apurado ainda a participação de Suel e Lessa em ações da milícia. No caso de Lessa, segundo Almada, já foi noticiado que ele participava de um grupo de extermínio e exploração de TV por assinatura ilegal em comunidades. “A suspeita existe, mas o diagnóstico do envolvimento nesse nível e qual exatamente no que tange a todo o contexto do fato criminoso, a gente vai exaurir dessa prova para que possa determinar com a certeza necessária isso aí”, explicou.
A Operação Élpis, que resultou na prisão do ex-bombeiro é a primeira fase da investigação que apura os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, além da tentativa de homicídio da assessora Fernanda Chaves.
Segundo Leandro Almada, “a novidade na apuração do caso é a delação, que não ocorreu por acaso, mas é fruto de muito trabalho da PF e do Ministério Público de revisitar todas as provas”.
“Nós melhoramos o arcabouço probatório para que a gente pudesse ter essa linha estratégica de uma delação, e a versão apresentada foi corroborada depois com um levantamento, e essa é a parte primordial. Não adianta a gente receber a informação por si só. A colaboração só tem efeito quando é corroborada”, disse o superintendente em coletiva na sede da PF.
O que foi divulgado nesta segunda-feira pela Polícia Federal, pelo Ministério Público, pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, e pelo diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, sobre a Operação Élpis, é parte do que foi apurado até agora. O restante está mantido em sigilo para aprofundar as investigações.
“Foi um trabalho iniciado no mês de fevereiro, e hoje a gente entende que do ponto de vista investigativo e de estratégia, que a gente divulgue essa primeira fase desse trabalho que diz respeito exclusivamente à investigação da mecânica do crime, execução e planejamento imediatamente anterior, os atos preparatórios e executórios desses crimes”, disse o superintendente Leandro Almada.
O assassinato da vereadora e de seu motorista completou cinco anos, e ainda é feita a pergunta: Quem mandou matar Marielle? Para o superintendente da PF, embora seja uma fase inicial das apurações, foram obtidas provas que confirmam o que Élcio Queiroz contou em delação.
Promotor Fábio Corrêa de Mattos fala à imprensa sobre a Operação Élpis – Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
“É uma fase do trabalho que ainda não terminou, mas a gente conseguiu carrear provas muito consistentes para reforçar o trabalho anterior que já vinha sendo feito e não tinha conseguido ser concluído”, disse Leandro Almada, acrescentando que essas provas, entre outros pontos, esclarecem como foi a mecânica do crime.
A Operação Élpis é a primeira realizada após o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, ter pedido, em fevereiro, a instalação, pela Polícia Federal, de um inquérito para investigar em trabalho conjunto com o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), as mortes da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes e a tentativa de homicídio de Fernanda Chaves, a assessora da parlamentar.
De acordo com o superintendente da PF, o trabalho teve apoio importante do Departamento do Sistema Penitenciário Nacional (Depen) e do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Conforme Almada, a equipe da PF nas investigações conta com nove agentes.
O coordenador do Gaeco do MPRJ, promotor de Justiça Fábio Corrêa, disse que “o anunciado hoje é resultado de muita perseverança e responsabilidade” e que essa etapa “é fruto de um trabalho silencioso de cada um dos profissionais que passaram desde o início das investigações”.
“Todo trabalho tem sido desenvolvido de forma muito constante e harmoniosa do MPRJ com a PF, e assim deve seguir dando uma sinalização muito clara que as instituições estão buscando e oferecendo respostas de um crime tão emblemático e, principalmente, em relação ao crime de homicídio, que é um dos crimes mais graves, senão o mais grave no nosso ordenamento jurídico”, disse.
Depoimentos
Já prestaram depoimentos à Polícia Federal Dênis Lessa, irmão de Ronnie Lessa; e Edilson Barbosa dos Santos.
O delegado Guilhermo Catamby informou que pretendia ouvir, ainda nesta segunda-feira, Maxwell Simões Corrêa e a mulher dele. Ainda segundo o delegado, apesar de terem recebido uma intimação para comparecerem à Superintendência da Polícia Federal, eles não foram porque não era coercitivo.
Edição: Fernando Fraga