A lição do sapo | por Iron Junqueira
Estava eu observando a vegetação num bonito jardim, quando vi pequeno sapo camuflado entre ramos e folhas secas. Tinha os olhos estatelados e fixos a lugar nenhum. Monstrinho feio, mas dócil e atento. De quando em vez esticava sua língua elástica e voltava com um inseto nela grudado.
Paulo Sérgio, um rapaz que foi criado no Lar da Criança e que ali vive nas suas horas de folga de motorista, cuidando de afazeres largados, vinha lá com uma bomba de matar insetos pendurada às costas. Quando ele viu aquele par de olhos fitando-o sem piscar, deu um salto para trás e apontou-lhe o bico da bomba, tropeçou com o calcanhar e caiu sentado dentro de um rego d’água. –– Õooooopa! Reclamou, levantando-se, enraivecido sem tirar os olhos do sapinho. Você vai ver comigo, trem feio! Disse e apontou o bico da mangueira e quis puxar a manivelinha da bomba, no intento de zerar o bichinho.
–– Não, Paulo! Falei-lhe. Não faça isso! E o anfíbio soltou mais umlinguado e retirou um mosquito que assentara na sua mão. Ele deu outro grito: –– Uuuuiiipa! Mas agradeceu o olho grande pelo livramento, esclarecendo: –– Pode ser que me livrou de um mosquito “Chikungunya”, né?
–– Então? Pode ser… Não podemos dizimar a biodiversidade, mormente no ambiente dela. Faz parte de a cadeia alimentar. Sapinhos, gafanhotos, pardais, tudo tem sua finalidade natureza afora.
–– Pois é. E eu quase taco “colírio” no sapo! Se não fosse o tombo que levei. E foi trocar a roupa molhada.
Fico aqui olhando as flores aladas, as borboletas que sumiram da cidade, quase não as vejo por lá. Penso nos problemas que se acumulam na minha mente. Quando as pessoas se encasquetam com uma ideia não há quem as convença do contrário. Meus amigos e irmãos de fé e ideal que me deixaram no fim da caminhada não podem avaliar que falta me fazem. Eles viram que no propósito de construir a nova sede do Lar da Criança Humberto de Campos – e que o fiz só depois de pronta a novel sede, razão pela qual não deixei de atender as crianças precisadas de atendimento, nem um dia ao menos, nossa entidade enfrentou o período de construção vendo os amigos se debandar dizendo que “o Lar estava rico, tinha muitos apartamentos” – e outros oportunistas dançaram em cima dos antigos colaboradores do Lar e os chamaram para auxiliarem em outros locais. Às outras entidades beneficentes, achei justo, mas outras casas que nada de especial oferecem ao povo, não foram legais. Pois sim: a gente explicou pela imprensa, vários meios de comunicação e, pessoalmente, que o Lar, nesse período de edificação dos prédios, não poderia manter seu quadro de funcionários especializados no atendimento à infância; que não nos deixassem. Mas se foram. Não conseguimos segurar todos. Claro que entendemos que muitos partiram para a Cobertura Azul. Mas Deus, generoso e bom, nos amparou quando muitos nos deixavam, através de um Convênio com a Prefeitura.
Quero dizer que a construtora ainda não nos entregou os apartamentos. E mesmo que os tivesse entregues, estamos na crise mais difícil que este país já passou, não há como alugar imóveis que somem as despesas mensais da casa que tanto atende as criancinhas. Se vamos pedir socorro, nos respondem: –– E os apartamentos?
–– Espero os interessados. Mas, enquanto isto temos uma amiga nos ajudando. Mas apenas por dois meses, findos estes, não terei mais os amigos, os que se desertaram porque não acreditaram em minha palavra. Mas continuarei enquanto puder e Deus nos estender sempre sua mão dadivosa. Quando não der mais, quem sabe paramos por bom tempo, até que a primavera volte e, com ela, a beleza de se ser útil ao mais importante jardim da vida – o jardim da infância. Não posso convencer a todos. Mas enquanto esse tempo não chegar, farei como o sapinho no seu cantinho: catando no ar o que Deus mandar, mas sempre salvando vidas, engolindo Zikas Vírus, seguro de que os homens que combatem a Dengue, jamais venham borrifar tristeza nem desânimo no sapinho de olhar estatelado no céu, querendo que chova esperança. É isto.